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Clara Charf, viúva de Marighella, morre aos 100 anos

Foto: Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (Brasil) / Arquivo “Entrevista com Clara Charf — 20/08/2012”

A ativista de esquerda e referência histórica da luta pela democracia e pelos direitos das mulheres no Brasil, Clara Charf, morreu nesta segunda-feira (3), aos 100 anos, em São Paulo. A informação foi confirmada pela Associação Mulheres pela Paz, entidade fundada e presidida por ela. Clara estava internada há alguns dias e morreu de causas naturais, após ser intubada.

Figura central na resistência à ditadura militar, Charf tornou-se um símbolo da militância progressista no país e deixa um legado marcado por sua trajetória de coragem, resiliência e compromisso com os direitos humanos.

“Clarinha morreu de causas naturais. (…) Uma vida com tamanha luminosidade fica gravada em todas e todos que tiveram o enorme privilégio de aprender com ela. Vá em paz, querida guerreira”, disse Vera Vieira, diretora-executiva da Associação Mulher pela Paz, em comunicado.

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Reprodução/Instagram/@associacaomulherespelapaz21

Trajetória marcada pela luta

Nascida em 17 de julho de 1925, em Maceió (AL), filha de judeus russos que fugiram de perseguições antissemitas na Europa, Clara cresceu em Recife, onde ainda jovem se aproximou de militantes comunistas. Aos 21 anos, filiou-se ao Partido Comunista Brasileiro (PCB) e iniciou sua vida política, que seria marcada por perseguições, clandestinidade e resistência.

Nos anos 1950, começou seu relacionamento com o guerrilheiro e líder comunista Carlos Marighella, de quem se tornou parceira de luta e vida até 1969. Juntos, militaram contra a ditadura e integraram a Ação Libertadora Nacional (ALN), criada para combater o regime.

Após o assassinato de Marighella pela repressão militar, em 4 de novembro de 1969, Clara foi obrigada a se exilar em Cuba, onde viveu por 10 anos sob identidade falsa, atuando como tradutora. Voltou ao Brasil com a Lei da Anistia, em 1979, e se filiou ao recém-criado Partido dos Trabalhadores (PT), tornando-se um nome importante na sua construção.

Protagonismo feminino e defesa dos direitos humanos

Referência no movimento feminista e na defesa da democracia, Clara Charf fundou em 2003 a Associação Mulheres pela Paz, que impulsionou iniciativas de combate à violência contra a mulher e valorização feminina na política e na sociedade.

Sob sua liderança, a entidade coordenou a indicação coletiva de 52 brasileiras ao prêmio 1000 Mulheres para o Nobel da Paz de 2005, um marco na representatividade das mulheres brasileiras no cenário internacional.

“Clara Charf gravou seu nome na história das lutas sociais e do feminismo no Brasil”, destacou em nota a direção da organização.

Homenagens

Nas redes sociais, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva lamentou profundamente a perda, destacando a importância da ativista para a construção da democracia brasileira.

“O Brasil perde uma mulher extraordinária. E eu perco uma companheira de muitas caminhadas. Convivi com Clara por mais de 40 anos e aprendi muito com ela sobre política, solidariedade, resistência e humanidade. Hoje me despeço dela com carinho, respeito e gratidão”, escreveu Lula.

O escritor e religioso Frei Betto também prestou homenagem, ressaltando o papel histórico de Charf:

“Ser mulher de um revolucionário é, muitas vezes, ser silenciada pela narrativa dos heróis. Mas Clara não coube nesse silêncio. Fez da vida um território de cuidado e da lembrança, um ato político. Morre centenária, vitoriosa, acreditando que o mundo pode ser melhor.”

A presidenta do PT, Gleisi Hoffmann, destacou o legado de coragem deixado por Clara:

“Clara Charf gravou seu nome na história das lutas sociais e do feminismo no Brasil. Enfrentou a ditadura, o exílio e as injustiças com coragem, persistência e esperança.”

Instituições ligadas à luta pelos direitos humanos, como a Fundação Maurício Grabois e a própria Associação Mulheres pela Paz, publicaram notas exaltando sua trajetória e compromisso com a justiça social. Em seus comunicados, as entidades afirmaram que a memória da ativista permanecerá como guia para as futuras gerações que seguem defendendo democracia, igualdade e liberdade no país.

Velório e cremação

O velório ocorre nesta segunda-feira no Cemitério São Paulo, em Pinheiros, e o corpo seguirá para o Crematório da Vila Alpina, na capital paulista.

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